Por isto, trago aqui uma síntese do que pretendo apresentar e aceito sugestões e opiniões sobre forma e conteúdo. A apresentação será seguida de fotos, contudo não colocarei todas aqui. Segue uma condensação da ideia geral:
(começo)
Provavelmente
todas vocês tiram várias fotos por dia, por semana ou por mês.
Provavelmente todas vocês tiram mais fotos que suas mães, quando
elas tinham suas idades. A fotografia em formato digital, nos permite
registrar nosso cotidiano, ao mesmo tempo que faz parte do nosso
cotidiano. Agora mesmo,
diversas pessoas aqui presentes, tem a
possibilidade de tirar um
celular do bolso ou da bolsa
e tirar uma foto.
Bom,
apesar de todas vocês tirarem dezenas, centenas ou milhares de
fotos… Eu duvido que vocês postem todas as fotos que vocês
tiraram. Talvez vocês não pensem muito sobre isto toda vez que vão
escolher uma foto, mas vocês selecionam fotos. Porém, como vocês
escolhem as fotos que vão postar? Como vocês escolhem as fotos que
vão mandar para as suas colegas?
Eu
ainda não conheço vocês, mas acho que uma resposta possível seria
que vocês escolhem as fotos mais bonitas. Ou que vocês escolhem as
fotos com mais qualidade. Porém, o que é bonito? O que é
qualidade? Por que não apreciamos todas as fotos? Por que
classificamos as fotos em postáveis e em não postáveis?
Eu
fiz esta pequena introdução, porque minha apresentação é sobre
isto. Vou tentar contar uma breve história, sobre algumas fotos que
tirei em Timor-Leste e como algumas mulheres leste-timorenses me
fizeram repensar meus pressupostos de fotos com qualidade e fotos sem
qualidade... Fotos
bonitas e fotos feias.
Em
2014 fiquei quatro meses em Díli, capital de Timor-Leste fazendo uma
pesquisa em antropologia. Eu pretendia estudar as tecedeiras do tais,
um tecido feito de algodão, produzido apenas por mulheres. Em Díli,
eu tive a sorte de encontrar um espaço, no qual eu poderia realizar
esta pesquisa (frequentei
este espaço de 22 de outubro de 2014 até 15 de dezembro de 2014).
Tal espaço era
o Sentru Suku Foudasaun Alola, mas Ofélia e outras mulheres se
referiam ao espaço como Taibesi; “em Taibesi”, “lá em
Taibesi” e eu chamava o espaço de Galpão principalmente para não
confundir com o bairro homônimo, onde o Sentru Suku se localizava,
que era Taibesi (Lê-se Taibesse).
No
Galpão trabalham a Ofélia, que era a manager, a Marina que
trabalhava no financeiro, além de 17 mulheres entre tecedeiras e
costureiras, cozinheiras e etc e 2 homens que faziam tarefas
diversas. As atividades que ocorriam no Galpão eram basicamente
dividas entre costura e tecelagem, mas havia pessoas que trabalhavam
com outras tarefas, como cozinheira, ou assistente financeira e
afins.
Fui
apresentada pela Ofélia para as mulheres do Galpão como voluntária
e estudante que pesquisava cultura. Logo tive a impressão que elas
(as mulheres) achavam que eu era uma espécie de assistente da
Ofélia. Talvez por eu perguntar muitas coisas para Ofélia. Pois
dentro de uma pesquisa em antropologia, as antropólogas costumam ter
mais proximidade a uma ou duas pessoas em campo. Esta pessoa que se
tem mais proximidade e diálogo, costuma ser chamada de
interlocutora.
O
campo, pode ser entendido com o lugar qual se realiza a pesquisa.
Assim o meu campo era o Galpão. E minha principal interlocutora era
a Ofélia. Ofélia era quem mais conversava comigo, principalmente
por ser a pessoa que eu menos atrapalhava em campo, e também por
falar português fluente e ter o português como língua materna.
No
Galpão as costureiras e tecedeiras eram a maioria das funcionárias.
Com exceção da Ofélia e da Marina, todas as outras funcionárias,
pareciam ter o mesmo status, no sentido de reconhecimento entre elas.
Situação percebida por mim através do meu uso da câmera em campo,
a partir das fotos que tirei e mostrei para elas.
Nos primeiros dias em campo, eu disse para Ofélia que eu poderia tirar fotos do cotidiano de trabalho se ela quisesse e ela disse que seria ótimo porque assim ela poderia fazer uma exposição com as fotos lá no Galpão mesmo. Com o intuito de fazer a possível exposição, eu saia todos os dias em circuito e percorria o espaço todo tirando fotos de todas presentes. Na primeira vez que eu queria tirar foto de alguém, eu sempre perguntava se eu poderia tirar a foto; “bele foto?”, todas autorizaram. Essas circulações para tirar fotos ajudaram-me a aprender o lugar que cada uma tinha na produção, como aprender seus nomes.No primeiro dia que levei a câmera, tirei várias fotos, porém, meu esforço de fotografar encontrou duas situações: pessoas que tinham atividades mais paradas e pessoas que tinham atividades com mais movimento. Das pessoas que estavam paradas, como por exemplo, as costureiras; eu batia apenas duas, ou três fotos porque já ficavam boas para eu entender o que estava acontecendo e esteticamente pareciam-me interessantes também. Contudo, de pessoas que estavam em movimento, como tecedeiras, eu “tinha” que tirar cinco, seis fotos para achar que uma estava boa, que não estava tremida.Durante o almoço as mulheres pediram para ver as fotografia e aí quando viram que de uma pessoa eu tinha três fotos e de outra tinha seis, ficaram chateadas. Não falaram mais do que “Duas minhas, quatro de fulana”. Entretanto, deram-me a entender que a atenção tinha que ser igual, dividida de forma justa. Mesmo que na minha percepção algumas fotos não tinham tanta qualidade, então não contavam, por isso que eu precisava tirar outras. Mas para elas essa desigualdade numérica de fotos parecia ser o reflexo de que eu estava dando mais atenção para uma do que para outra, ou que eu não considerava tanto aquela que tinha menos fotos, que gostava mais da outra que tinha mais fotos. Era uma questão de qualidade para mim e de quantidade para elas. (trechos adaptados da minha monografia)
Aqui
podemos voltar para a questão que eu fiz no começo. O que faz vocês
escolherem fotos para postar? E escolher fotos para não postar?
Vocês acham que o que é entendido por bonito, por exemplo, é
entendido universalmente como bonito? Vocês acham que o que é
entendido como com qualidade é entendido universalmente com
qualidade? Será que se selecionarmos uma foto que vocês, ou alguma
de vocês acha bonita, esta foto será considerada bonita por
pessoas na Ásia, na África, na Europa e
etc?
Será
que nossa relação com as fotos, de buscar ângulos perfeitos,
cenários perfeitos, sorrisos perfeitos… Não nos dizem que nunca
teremos fotos perfeitas? Dito, isto porque vejo várias pessoas,
inclusive eu, falando “está foto estaria ótima se não fosse...”
“este fundo”, “a luz”, “a qualidade”, “alguém ter
passado no meio da foto”. Porque as fotos que tiramos não são
perfeitas? Porque as fotos que tiramos precisam de photoshop?
Será
que a gente não tenta
reproduzir fotos que são entendidas como bonitas, nas revistas, na
televisão, na internet?
Quando eu falo a gente, estou dizendo nós
aqui, brasileiras, ocidentais.. Será que as pessoas do outro lado do
mundo tem a mesma relação com a imagem e a imagem pessoal, que a
gente?
Voltando,
a minha conduta em campo, com as mulheres leste-timorenses. Quando eu
entrei em campo, eu procurava ter pelo menos uma foto boa de cada
pessoa, independente da quantidade de fotografias que eu precisasse
bater para isso. Então, para mim não tinha nenhum problema ter
quatro fotos de uma pessoa e duas fotos de outra pessoa. Porque no
fundo, só havia uma foto, entendida por mim, como boa.
Enquanto
para as mulheres, ter quatro fotos de uma e duas fotos de outra era
chato, pois elas não fazia a mesma diferença que eu fazia entre
fotos boas e ruins. Eu dividia as fotos em boas e ruins, porém para
elas todas as fotografias eram fotografias. E elas estão certas,
todas as fotografias são fotografias. Estas diferenças entre fotos
boas e ruins, fotos bonitas e fotos feias, são diferenças criadas
por nós. Elas não existem fora da nossa interpretação das fotos.
Esta
gafe em campo, me ajudou a pensar diversas coisas. Mas com certeza
está gafe me fez pensar sobre como ao chegar em campo, eu
naturalizei para todas as mulheres que eu conheci, a ideia que eu
tinha de fotos boas e fotos ruins. Ao mesmo tempo que elas me
mostraram, que a ótica que eu tive era completamente colonizada e
ocidental. Se eu não tivesse levado a câmera para campo, não pensaria em como as fotos enquanto imagens capturadas e selecionadas são construções sociais.
(fim)
Na
minha monografia abordo esta mesma situação em campo com as fotos,
mas minha abordagem é outra. É voltada para o status das mulheres
nas relações de trabalho. É interessante pensar como é possível olhar sob outras óticas um mesmo assunto.
Também é engraçado pensar que cada apresentação demanda da gente uma atenção específica. E ao contrário das minhas expectativas, a ansiedade para apresentar trabalhos ainda não diminuiu e o trabalho para fazer os slides ainda é o mesmo.
1 - Sobre queimar o filme, mas salvar alguns negativos: entre lentes ocidentais e mulheres leste-timorenses.
Por Andreza Ferreira
2 - Paisagens culturais leste-timorenses pelas lentes de um antropólogo amador em busca do campo. Por Miguel Filho
25/10 - Terça-Feira, das 10 às 12hs
1 - “Agora fazemos assim”: o projeto Mobile Courts e o processo de transposição da modernidade no Timor-Leste contemporâneo.
Por Henrique Romanó Rocha
2 - Paisagens culturais leste-timorenses pelas lentes de um antropólogo amador em busca do campo.
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26/10 - Quarta-feira, das 8h30min às 10hs.
1 – As Donas da Palavra. Por Daniel Simião;
2 – Sacralidades Timorenses. Por Daniel Simião, Henrique Romanó Rocha e Sarah Almeida.
27/10 - Quinta-feira
1- Cotidiano universitário em Díli: experiência acadêmica na Universidade Nacional Timor Lorosa'e. Por Sarah Almeida.
2 - "As tradicionais? Elas fazem tudo pela imaginação! A gente não! A gente tem aula, aprende certinho." - A universidade e as parteiras em Timor Leste. Por Natalia Silveira.
PS: Qualquer crítica, comentário, ou sugestão: meu e-mail é artesanatointelectual@gmail.com
2 PS: Todas as fotos da postagem, com exceção da foto do cartaz, são fotos tiradas por mim.
2 PS: Todas as fotos da postagem, com exceção da foto do cartaz, são fotos tiradas por mim.